sexta-feira, julho 14, 2006

QUASE TUDO

Grande Mestre Jacaré, necessito do seu iluminado e sempre pertinente conselho. Ando há cerca de um mês envolvido com uma rapariga. Para todos os efeitos, somos praticamente namorados, mas a verdade é que ela não quer assumir uma relação, porque saiu há três meses de um namoro longo que a deixou muito magoada e céptica. Eu sou um homem romântico e gosto de preparar à minha mulher algumas surpresas românticas dignas dos filmes, como enviar-lhe um cesto gigante de flores, levá-la a um bom restaurante e ao teatro, ou oferecer-lhe uma noite romântica num hotel mais requintado. Não quero que ela se sinta obrigada a assumir comigo por causa do que lhe dou, apenas faço as coisas porque gosto de a ver feliz e acho que ela merece. O outro namorado nunca lhe ofereceu uma flor! Mas ainda que goste de mim, ela continua de pé atrás e com medo de investir na relação. Que mais posso fazer para a conquistar de vez?
Leitor identificado

Meu caro amigo, a questão fulcral aqui não é o que pode fazer mais. É o que deve fazer menos. Esse seu envolvimento é ainda demasiado recente para andar a investir tanto numa mulher que, ainda por cima, parece não saber o que quer – ou se o quer. Só há duas maneiras de lidar com uma mulher indecisa: se ela for permissiva, tome você as decisões por ela e deixa de haver dúvidas; se ela for obstinada, ponha-se a milhas, que essa gaja só lhe pode dar amargos de boca. Não gaste o seu tempo (e a sua atenção e o seu dinheiro e a sua afeição) com uma gaja que não se decide – nem se quer decidir. Pode bem vir a descobrir mais tarde que apostou no cavalo errado.

Por outro lado, e ainda que se sinta animado para o fazer, um homem nunca deve jogar todos os seus trunfos no início da partida. Como em tudo, também nas relações amorosas “o segredo é a alma do negócio” e, muitas vezes, a sedução do mistério é de longe mais cativante que a falta de magia de um universo desvelado. Quero com isto dizer que, se um homem se revela e se entrega todo demasiado cedo a uma mulher, habilita-se a que ela se aborreça e perca rapidamente o interesse, porque deixa de ter o que descobrir e fazer por merecer da parte dele. Anote o que lhe vou dizer a seguir, pois é algo que nunca deve esquecer: a insatisfação nutre a paixão. O homem inteligente sabe que nunca deve satisfazer completa e absolutamente a sua amada. Porquê? Porque, paradoxalmente, uma mulher completamente satisfeita é uma mulher que não tem razões para lutar pela sua relação. De facto, ela sente-se segura, sente-se completamente satisfeita e, logo, não tem motivos para se preocupar. E daí a tomar a relação como dado adquirido e cair no tédio é um pequeno passo. Pelo contrário, uma mulher não totalmente satisfeita é uma mulher que sente que não pode descansar sobre os louros e, portanto, continua sempre a dedicar esforços à relação – e ao seu homem. Portanto, o homem inteligente mantém sempre a sua amada a um passo da satisfação total. É a regra do Quase Tudo. E é esse quase que faz toda a diferença.

Não se esqueça que o fogo de artifício emocional gerado por todas essas “surpresas românticas dignas dos filmes” muitas vezes acaba por cegar as pessoas para aquilo que realmente importa: as próprias pessoas. Por outras palavras, lembre-se que o importante é a companhia com quem partilha os seus momentos. As flores, o restaurante, o teatro, o hotel, tudo isso é secundário. Deve ser acessório, e não o centro de uma relação. É claro que, uma vez por outra, é importante oferecer à sua mulher – e a si mesmo – uma “surpresa romântica digna dos filmes” e dar mesmo quase tudo à sua amada. Porque a verdade é que elas merecem ser tratadas como Rainhas. Mas que isso seja a excepção, não a regra. Por um lado, porque esses gestos aumentam drasticamente as expectativas que a sua amada tem de si e, em pouco tempo, você vê-se forçado a dar-lhe aquilo que você mesmo a habituou a esperar de si – nem espere que ela se contente com menos. Mas, mais especialmente, porque corre o risco da sua mais-que-tudo se apaixonar por esse estilo de vida apaparicado e não... por si.