sábado, outubro 30, 2004

ILÍCITA ATRACÇÃO

Tenho uma amiga com a qual me dou com alguma frequência. Ela namora há uns anos, mas acho que ultimamente anda a fazer-se a mim. Não é nada concreto, apenas uns toques, uns olhares, umas bocas que ela manda. E cada vez mais se queixa do namorado. Toda a gente me diz que eu me devia atirar a ela, e parte de mim quer, mas não passa de atracção física. Eu não gosto dela amorosamente e toda esta situação incomoda-me. Que pensa o Jacaré disto?
Leitor identificado

A experiência ensinou-me que envolvimentos com raparigas comprometidas são sempre muito instáveis. Tão depressa a gaja parece estar completamente a cagar no namorado e mais que disposta a oferecer-lhe um belo par de patins (quando não é de cornos), como, num piscar de olhos, lhe volta a ser absolutamente devotada. Nada garante que ela não tenha um rebate de consciência em pleno encornanço e se ponha a milhas, deixando um gajo agarrado ao pau (literalmente). Porquê que isto acontece? Porque, por muito má que seja, a relação cria hábitos e todos sabemos que os hábitos são difíceis de perder. Especialmente os maus hábitos.

Avisado que está para este facto, prossigamos. Antes de tudo, é necessário o meu amigo tomar uma decisão. Estabelecer um objectivo. Quer saltar para a espinha da miúda? Então, faça-o. Faça-o literalmente. Não perca tempo (nem a oportunidade) com falinhas mansas. Não fale; aja. Da próxima vez que ela se insinuar, deite-lhe as garras e deixe o seu desejo carnal falar por si. Seja convicto e confiante e ela perderá a cabeça e deixar-se-á embalar pela loucura do momento, guiada pela libido. Mas cale-me essa boca e faça tudo para calar também a dela – seja criativo e invente maneiras de manter a boca dela ocupada (need I say more?). Porque, se ela não falar, também não pensa. Grande parte das mulheres pensa com a língua (porque é que acha que elas dão tanto à matraca?), portanto é imprescindível mantê-la ocupada – enquanto ela não parar para pensar como é errado e vergonhoso encornar o namorado, é você quem beneficia.

Ou prefere manter-se bem afastado dessa embrulhada? Nada mais simples! Nesse caso, fale! Seja directo e abra o jogo. Fale-lhe dos seus sentimentos, fale-lhe dos sentimentos dela. Fale-lhe da atracção que existe entre ambos ou, melhor ainda, diga-lhe que está apaixonado por ela. Vai ver a rapidez com que ela ganha distância de si e jura que sempre o encarou apenas e só como amigo.

Parece paradoxal? Não é. Repare: o que existe entre si e esta rapariga é apenas uma atracção (se física ou amorosa, pouco importa para o caso). Contudo, dado que a menina é comprometida, essa atracção é indigna e ilícita. E, como tudo o que é ilícito, deliciosamente tentadora. Porém, é também errada. Vil, suja, ignóbil. Vergonhosa. PECAMINOSA. Contudo, enquanto essa atracção permanecer nas sombras, intocada, e não for nomeada, no fundo é como se não existisse. E isso, obviamente, mantém apaziguada a consciência da menina atiradiça. A partir do momento em que se falar no assunto e ele for nomeado, é como se se deitasse um jorro de luz sobre a coisa, mostrando-a sob o seu verdadeiro aspecto: uma abominação malcheirosa e cabeluda! E, acredite, a partir dessa hora, a rapariga só vai querer distância de todo o abjecto assunto.

Agora, cabe-lhe a si decidir o que fazer. Contudo, também lhe digo isto: qualquer outro gajo na sua situação não pensaria duas vezes antes de se atirar à gaja – não é o pormenor de gostar ou não dela que o impediria de a furar. Mas o meu amigo dá mostras de ser feito de outra têmpera e revela alguma preocupação pelos seus sentimentos, para além da mera atracção física. Obviamente, você não é um alarve que come só porque a mesa está posta. Isso torna-o uma pessoa nobre e de valor. Os meus parabéns! Só espero que não fique muito frustrado quando se aperceber que, neste mundo, os gajos nobres e escrupulosos como você acabam por nunca comer gaja nenhuma.