domingo, setembro 10, 2006

O PAPEL DO NAMORADO

Senhor Doutor, sou um leitor assíduo das suas rubricas e tenho-o em muito boa consideração e às suas opiniões. (...) Tenho uma namorada há 6 meses de quem gosto muito, podemos até dizer que a amo e que sinto que esta é a mulher da minha vida, mas tenho medo de não ser esse o sentimento dela por mim. Amamo-nos muito nos momentos mais íntimos, e sinto-me plenamente feliz quando estou com ela. Seja até quando estamos com amigos dela e meus, conseguimos sempre ser o casal perfeito. Ela é sempre muito atenciosa e carinhosa. No entanto, tenho reparado que em diversas ocasiões ela me acusa de ser ciumento, quando na verdade eu cinjo-me apenas ao meu papel de namorado. O outro dia sai com ela e mais uns amigos, dela, e fomos a uma disco. Compreende que estar com a minha namorada numa noite e mais uma mão cheia de gandulos, não é cena que qualquer gajo almeje. Mesmo assim lá fui e a noite correu relativamente bem. Até que chega à hora em que lhe digo que me quero vir embora e ela me diz: ‘vai tu que eu ainda fico’... Pergunto: O quê?! Então vou-me embora e deixo lá a minha namorada!? E ela, fica lá a fazer o quê, sozinha com aqueles tipos? Não passámos já um serão suficientemente agradável com os amigos? E claro, se sou eu quem está mal e se quer vir embora, logo vou e sozinho! Go figure! Ela insultou-me e acabou por vir comigo contrariada. Agora não me fala há uns dias. Mais uma vez pergunto: Serei eu muito old Fashion, por querer trazer a minha miúda comigo p’ra casa no final da noite? Isso é ser ciumento e, acima de tudo, possessivo? E por isso mereço ser insultado? Gosto dela porra, e não me sinto bem a deixá-la sozinha! Saimos juntos, logo estamos juntos! Não vejo onde é que isso é ser considerar-me ciumento ou possessivo! (...) Diga-me por favor o que fazer...
Leitor anónimo

Meu caro amigo, pelo que consigo compreender pela sua descrição, o seu problema resume-se a duas palavras: conflito de valores. Aquilo que você entende como o seu “papel de namorado” não coincide exactamente com a ideia da sua mais-que-tudo. Ou seja, você e a sua menina têm visões diversas sobre o que deve ser o papel do namorado (ou da namorada) numa relação. Repare que ela pode bem estar há muito habituada a ir dançar para a discoteca com “uma mão cheia de gandulos” até ver o Sol raiar e não estar disposta a abdicar disso, ainda que você agora faça parte da sua vida. Se para si é inconcebível sair à noite com a sua amada e regressar sozinho para casa, deixando-a na discoteca como seu rebanho de mariolas, para ela, a sua decisão de a trazer consigo quando você decide dar a noite por terminada pode ser entendida como uma imposição limitadora da sua liberdade. Enquanto para si a unidade do casal está primeiro, para ela parece estar a autonomia individual. Por outras palavras, se para você “saímos juntos, logo estamos juntos,” para ela “amigo não empata amigo.” Talvez ela até preferisse que você ficasse na disco com ela, mas não o forçou. Pelo contrário, deixou-o ir. E agora, que lhe resta a si fazer? Vai obrigá-la a ver as coisas à sua maneira e a proceder como você quer? Quer entrar nesse braço-de-ferro com ela? Claro que não. Seria a morte (rápida) da relação. Naturalmente, a resolução para este problema reside numa solução de compromisso entre os cônjuges. Ou seja, cada um tem de dar o braço a torcer à vez. Mas tenha sempre presente que as suas convicções em relação ao que considera ser o “papel do namorado” são tão válidas quanto as dela e que, se quer exigir certos direitos, tem de estar preparado para ceder outros. De outro modo, é impossível chegar a acordo.

Em último caso, olhe, deixe de acompanhar a sua amada nas idas à discoteca – elimine a acção e eliminará o atrito. Porque o problema só surge quando você também vai, uma vez que, ao contrário da sua deusa, o meu amigo não tem paciência para desperdiçar a noite inteira na discoteca. Você pode não gostar desta via, mas lembre-se que mais vale ser você a sugerir essa alternativa ocasional do que vir depois a descobrir que ela o anda a fazer repetidamente nas suas costas, porque não se sente completamente à vontade quando sai consigo. A minha mãe sempre me disse que “mais depressa se prende a pessoa amada pela liberdade do que pela força.”

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